Fechei a porta e olhei de novo para ela.
- Só vim porque foi a tua mãe que me pediu.
- Senta-te - ela apontou para a cadeira que estava ao lado dela. Ficar em pé não era uma boa ideia...não com um Santiago na barriga. Caminhei em direcção da cadeira e sentei-me, olhando sempre para ela - obrigada por teres vindo. Obrigada mesmo.
- Estou curiosa...que tens tu para me dizer?
- Tanta coisa, mas a mais importante de todas é um pedido de desculpas. Ana - a Pilar virou-se para mim e agarrou-me na mão - desculpa tudo o que te fiz. Pelos arranhões, as chapadas...pelo processo, pelo Sergio. Eu não estou bem e só agora consegui pedir ajuda. Estava cega e só via a fama à minha frente, mas hoje sei que há mais coisas para além disso. E...a Esperanza só me veio ajudar.
- Todos na vida merecemos uma segunda oportunidade.
- Desculpas-me?
- É complicado, Pilar. Não sei se tens a noção, mas de ti eu só queria distância, queria que me deixasses em paz, depois de tudo o que aconteceu. Depois do processo, de teres chantageado o Sergio e pelo meio eu ter perdido um filho dele por todo o stress. É complicado esquecer todo o mal que existiu da tua parte para mim.
- Eu não te peço que sejamos as melhores amigas, mas...queria muito que aceitasses as minhas desculpas, iria sentir-me muito melhor.
- Se te sentirás melhor assim, eu aceito-as. Ser acusada de não ajudar é que não quero.
- Nada disso. Acho que estamos todos a entrar numa nova fase - o discurso da Pilar tinha mudado. Ela estava diferente.
- Concordo.
- Agora, quero agradecer-te tudo o que estás a fazer pela minha família. Pela minha filha. Ana, há muito poucas pessoas como tu. Eu não estou a 100%, nem sequer a 50%, mas estou lúcida sei o que te estou a dizer, sei o que estás a fazer, o que sentes para comigo e o que eu quero que sintas. Eu não sei como te agradecer dares um lar à minha filha, não queria nada que ela fosse para outra família. A minha esperança é sair do centro psiquiátrico e tentar estar bem para e por ela. É a Esperanza que vai ser a minha força nos tratamentos. Sabendo que ela vai estar bem entregue, que vão amá-la, dá-me força para depois ser eu a cuidar dela.
- É muito bom ouvir isso, Pilar. Estamos todos com a mesma expectativa.
- Se não fossem tu e o Sergio...talvez não estivesse disposta a faze-lo.
- Eu prometo que a Esperanza será a princesa lá de casa. Cuidaremos dela como se fosse da nossa família.
- Um dia, se vos conseguir agradecer por tudo será um alivio.
- Não penses que é um fardo...fomos nós que nos oferecemos. Somos nós que o queremos fazer.
- Mas...tu estás grávida.
- Isso não é impedimento nenhum. Entramos em estágio mais cedo - com a minha saída a Pilar gargalhou e voltou a agarrar-me na mão.
- Obrigada por tudo, obrigada mesmo.
- Não tens nada que agradecer. O maior sinal de que estás agradecida pelo que fazemos, é seres tu a ir buscar a Esperanza a nossa casa.
- Tudo farei para que esse dia aconteça.
- Vamos esperar por ti...e, estás preparada para ir para o bloco?
- Sim, cesariana não deve custar tanto como um parto natural.
- Talvez...
- Já decidiste como é que o teu bebé vai nascer?
- Parto natural...
- Se fosse até ao fim do tempo acho que não me deixavam fazer na mesma.
- Tens andado muito medicada é natural.
- Talvez... - nisto somos interrompidas pela entrada da enfermeira.
- Peço desculpa interromper, mas temos de a levar para o bloco, Pilar.
- Senhora enfermeira, desculpe, acha possível ter lá outra pessoa? - perguntou a Pilar.
- Vai levar a sua mãe, estou certa?
- Sim, mas também queria que outra pessoa fosse.
- Poderá ser possível, temos é de preparar essa pessoa.
- Pode ser ela? - a Pilar apontou para mim e eu fiquei sem reacção, apenas olhei para a enfermeira que me olhou.
- Eu?
- Sim...a Esperanza vai ser tua, tinha um significado diferente assistires ao nascimento dela.
- Eu...não sei o que diga.
- Por nós pode ser, é só terem a certeza e preparamo-la.
- Claro, sim. Obrigada - acho que a minha adrenalina subiu para níveis históricos, nunca tinha assistido a um parto...e ser logo ao da Pilar...as voltas que a vida dá.
Sai com a enfermeira e fui preparar-me a uma sala, onde esta a mãe da Pilar.
- Que fazes aqui, Ana?
- A Pilar pediu-me para entrar convosco...e aqui estou eu.
- A serio?
- Sim.
- Que bom! - a Antonella abraçou-me e acabamos de nos preparar.
Depois de estarmos despachadas, fomos até à sala de espera onde estavam o Juan e o Sergio.
- Ana...que é que estás a fazer assim vestida? - perguntou o Sergio.
- Eu vou assistir ao parto. A Pilar pediu-me.
- Tu vais o que?
- Vou assistir ao parto.
- Eu não quero que vás!
- Desculpa? - os pais da Pilar olharam para o Sergio esperando uma resposta à minha indignação.
- Chega aqui - ele agarrou-me no braço e afastou-me do sitio - eu não quero que entres naquele bloco.
- Dá-me uma boa razão para não ir e eu não vou.
- Ana...simplesmente não vás.
- Não é boa o suficiente. Eu vou. A Pilar pediu-me e eu quero ir. Porque não queres que vá?
- Há demasiada coisa lá dentro. Ela pode fazer-te mal.
- Sergio...estive fechada com ela até à pouco e estou viva. É só o nascimento da Esperanza.
- Faz o que quiseres - ele saiu do hospital, deixando-me ali...desamparada.
Voltei para junto dos pais da Pilar e quando nos chamaram às duas entramos.
Dentro daquela sala vivi o momento mais lindo da minha vida. Havia nostalgia. Seria a primeira vez que todas veríamos a Esperanza. Era a primeira vez que iríamos amar aquele ser. A Pilar portou-se lindamente e cerca de 45 minutos depois de entrarmos a Esperanza nasce. Uma bebé linda que tinha o melhor nome do mundo que lhe poderiam dar.
Ao nascer, o rosto da Pilar mudou. Iluminou-se, encheu-se de luz e de lágrimas. Ela estava feliz. Naquela sala havia: amor de mãe, de avó e o meu...que estabeleci logo uma ligação com aquela bebé. Os médicos passaram-na para os meus braços, o choque do corpo dela nos meus braços foi saboroso. Apesar de muito sujinha que estava, era uma bebé linda. Senti-me...bem e senti que era qualquer coisa a ela. Não tinha nome. Não era tia, nem prima, nem nada...seria alguém que lhe ia dar amor, porque era o que ela precisava.