segunda-feira, 2 de novembro de 2015

63: “Ana, o teu filho…”

Ana sentia-se bastante dorida mas eram dores diferentes daquelas que sentia em casa. Sentia, mesmo com os olhos cerrados, que não estava em casa. Cheirava-lhe a éter...tinha conseguido sobreviver, estava viva mas estava num hospital, com dores e tinha medo de abrir os seus olhos. 
- Sentiu alguma alteração nela? – uma voz muito delicada, de senhora, fez-se ouvir. Ana ainda tentou abrir os olhos, perceber quem era mas, simplesmente, teve medo de o fazer. Escolheu ficar mais alguns segundos naquele escuro, com todas as perguntas sobre o que tinha acontecido na cabeça...preferiu não saber o que tinha acontecido – qualquer coisa chame-me – ouviu novamente a voz daquela senhora e, logo depois, uma porta fechar-se. 
Alguém lhe agarrou a mão direita, sentiu os lábios daquela pessoa junto da sua pele e sabia que não era Sergio. 
- Loca? Mario...pela forma como a tratava e pela voz, Ana percebeu que era Mario que ali estava – porque é que não acordas, porquê? Não podes ficar a dormir tanto tempo...
- Dormir é tão bom... – com a voz a sair-lhe mais baixo do que o habitual e a fazer pausas entre as palavras, Ana respondeu a Mario. 
- Loca? Ana, oh Ana! – sentiu um beijo de Mario na testa e, depois, ele passar-lhe com a mão pela cara. Devagar e com muito medo, Ana abriu os olhos encarando Mario – finalmente! Já devias ter acordado à mais tempo. 
- Quanto tempo... – sentiu uma picada forte no peito, não conseguindo continuar a pergunta. Voltou a fechar os olhos e a dor parecia começar a acalmar. 
- Estás bem? Eu já chamei a enfermeira.
- Sim... – voltou a abrir os olhos, reparando que Mario ainda não tinha saído do seu sítio – o que aconteceu? – e porque é que tu estás aqui...?
- Entraste em trabalho de parto em casa, sozinha. Chamaste a ambulância e acabaste por desmaiar.
- Eu lembro-me disso...
- E do resto? – Ana acenou negativamente com a cabeça e Mario acabou por se sentar na cama, continuando a agarrar-lhe a mão – a meio do caminho para o hospital acordaste e pediste que ligassem para os teus tios. Eles não atenderam e pediste que me ligassem... – Ana sorriu, acabando por fechar os olhos. Não se lembrava de nada desde que tinha desmaiado mas o que Mario lhe contava era-lhe familiar – cheguei aqui pouco tempo depois de tu teres chegado e... – Mario não conseguiu terminar a descrição de tudo o que tinha acontecido, já que a enfermeira entrou naquele momento no quarto. 
- Boa noite, menina Ana – era a mesma voz que tinha ouvido à pouco – como é que se sente?
- Tenho dores...
- O que é que lhe dói? – a enfermeira chegou perto de Ana, levando a sua mão à testa da rapariga. 
- O peito e um pouco as costas. 
- Não lhe dói a barriga? – Ana acenou negativamente com a cabeça e, por três breves mas longos segundos, o olhar da enfermeira estava preso na sua cabeça. Ana queria perguntar o que é que tinha acontecido. Queria saber se o seu filho estava bem. Se tinha nascido, se estava dentro de si ou...se tinha voltado a acontecer o mesmo com Santiago – eu vou chamar o seu cardiologista para a vir ver e, entretanto vou buscar algo que lhe irá fazer bem a todas essas dores. 
Ana fechou os olhos e, só quando a enfermeira saiu do quarto é que os voltou a abrir. Olhou para Mario, agarrando-lhe a mão. 
- Tenho tanto medo de perguntar o que é que aconteceu...
- A enfermeira vai dar-te todas as respostas. 
- O Sergio já sabe?
- Já. Eu liguei-lhe depois do jogo dele ter terminado e contei-lhe tudo o que aconteceu. Dentro de umas duas horas ele já cá deve estar. 
- Mario...podes ajudar-me?
- O que precisas?
- Não sei bem...acho que, se ficasse sentada seria melhor. 
- Vale Mario saiu da cama, pegando no controlador da mesma. Carregou no botão para que a parte de cima da cama subisse e Ana pudesse ficar mais sentada.
- Gracias. 
- Estás tão calma...
- Eu estou cheia de medo, Mario. 
- Não é preciso – Mario beijou-lhe a testa, sorrindo. Ana olhou para a sua barriga. Estava mais pequena, muito mais pequena...e, naquele momento, começou a chorar. Naquele momento soube que a sua barriga estava vazia, que o seu bebé já não habitava nela e abraçou Mario – ei, ei...que se passa?
- O meu bebé...eu não tenho o meu bebé, Mario! – o seu choro intensificou-se e uma raiva começou a crescer dentro dela. E, novamente, aquelas perguntas surgiam-lhe na cabeça. Como é que não consegues ser mãe? Porque é que os teus bebés não nascem? Ana gritou em desespero, deu um murro na barriga de Mario e sentiu-se a morrer por dentro. 
- Calma, por favor tem calma. Ana o teu filho... – Ana olhou-o, deixando as suas lágrimas à mostra e todo o seu sofrimento naquele momento. 
- Não me digas que ele está em paz. Por favor, não o digas! Ele estaria bem e em paz comigo! Porquê, Mario, porquê?! – o choro de um bebé fez-se ouvir assim que a enfermeira abriu a porta. 
Os olhos de Ana, naquele momento, abriram-se imenso e todo o seu corpo relaxou. Deixou de sentir as dores no peito, as dores nas costas e voltou a estar um pouco no seu mundo. Continuou a chorar imenso, as lágrimas caiam-lhe pela cara mas um sorriso apareceu-lhe nos lábios.
- Acho que o seu menino está impaciente por a conhecer... – a enfermeira chegou perto de Ana, entregando-lhe o bebé para os braços. 
Ao sentir o seu filho nos braços, era quase como se tivesse levado um choque eletrizante em todo o seu corpo. Aquele bebé, o seu filho, estava nos seus braços a chorar a alto e bom som. Passou com o seu dedo pelo braço do filho, pela bochecha e sentiu a força daquele bebé quando este lhe apertou o mesmo dedo.
- Olá, Vicente...
- Muito bem, agora já poderemos dar nome ao bebé mais agitado que nasceu esta noite – disse a enfermeira, visivelmente feliz.
- Eu pensei que...que tu não estivesses vivo, meu amor – sussurrou Ana, deixando as lágrimas tomarem conta de si outra vez. Encostou a cabeça à cama, fechando os olhos. E chorou, chegando mesmo a soluçar mas sempre com um sorriso nos lábios. 
- Ana... – Mario aproximou-se dela, passando com a sua mão pela cara de Ana – está tudo bem, loca... – Ana olhou-o, rindo-se. 
- Desculpem... – olhou para Vicente, agarrando na sua pequena mão – ele é tão lindo. 
- E muito saudável – Ana olhou para a enfermeira que lhe sorria – a Ana entrou em insuficiência cardíaca e tivemos de optar pela cesariana. Acabou por ter duas paragens cardíacas e por isso esteve tanto tempo a dormir. Mas está tudo bem consigo e com o seu filho. 
- Obrigada. 
- Vou deixar-vos um pouco a sós. Mas tente descansar, Ana. Há aí muita emoção para o seu coração – a enfermeira saiu do quarto e Ana voltou a prender o seu olhar no filho. 
- Já estavas a sofrer por antecipação... – comentou Mario, olhando para Ana. 
- E a dar-te porrada sem razão. Desculpa.
- Não tem mal, é compreensível. Eu devia ter dito logo que o Vicente estava bem. 
- A minha vida está cheia de momentos em que um segundo muda tudo...mas este é sem dúvida o melhor de todos. Acho que, nem eu mesma, consigo definir tudo o que sinto com este bebé nos meus braços. 
- Sente-o apenas e saboreia bem cada momento destes – Ana olhou-o, direccionando uma das suas mãos para Mario que, de imediato, segurou-a. 
- Obrigada por estares aqui...e por teres vindo quando te chamei. 
- Foi uma honra enorme fazer parte do dia do nascimento do Vicente. 
- Obrigada. 
- De nada – Mario levantou-se, dando-lhe um beijo na testa – olha, alguém estava com sono – os dois olhavam para Vicente que tinha adormecido nos braços de Ana. 
- Onde é que o ponho agora?
- Ali – Mario dirigiu-se à cama de bebé que estava um pouco afastada, aproximando-a de Ana que, depois de beijar a testa de Vicente, colocou-o dentro da cama aconchegando-o nos lençóis. 
- Obrigada, Mario. 
- Não precisas de me agradecer nada. 
- Que horas são? – Ana olhou-o, mantendo a sua mão dentro da cama, em contacto com Vicente. 
- Quase seis da manhã. 
- Ele nasceu ontem ou hoje?
- Hoje. Era perto da uma da manhã quando ele nasceu.
- Devias descansar, Mario – Ana percebia que ele estava cansado, cheio de sono – aposto que ainda não dormiste nada. 
- Por acaso não. Estive sempre a andar entre o teu quarto e o berçário. Mas eu estou bem, a sério, e espero que o Sergio chegue para ir para casa.
E assim foi. Enquanto Sergio não chegou aquele hospital, Mario manteve-se ao lado de Ana. Falaram, riram-se e também choraram. 
- O Sergio está a chegar – Mario levantou-se do cadeirão, indo até à porta do quarto. Abriu-a, espreitando para o corredor. Ana pôde vê-lo acenar...provavelmente para Sergio – calma, calma – Mario riu-se que nem um perdido depois de Sergio correr por aquele corredor com uma ansiedade enorme. 
- Eles estão aí? – Ana fechou os olhos ao ouvir a voz de Sergio. Sorriu e, quando voltou a abrir os olhos, já Sergio estava a caminhar em direção deles – oh meu Deus, gracias! – Sergio apressou-se a chegar perto da sua noiva e do seu filho – como é que estás? – deu um curto beijo nos lábios de Ana, olhando para Vicente – e tu, campeon
- Está tudo bem, Sergio. 
- Eu tive tanto medo que te acontecesse alguma coisa – Sergio encostou a sua testa com a de Ana, passando a sua mão pela cara dela – eu sabia que o Vicente estava bem...mas tu ainda não teres acordado deixou-me cheio de medo. 
- Está tudo bem...estamos os dois vivos, os dois bem. 
- Bom, meninos, eu vou indo sim? – Mario vestiu o seu casaco e Sergio, muito depressa, aproximou-se dele. 
- Calma, Mario obrigado por teres estado com eles enquanto eu não cheguei. Isso significa muito para mim e, eu ainda não falei com a Ana sobre isto – Sergio olhou para Ana, voltando depois a olhar para Mario – eu quero muito que sejas o padrinho do Vicente.

1 comentário:

  1. Holla :)
    Mais uma fic em dia...ALELUIA :P
    Já tinha lido o capitulo quando o publicaste, mas o tempo tem sido pouco para ler, comentar...mas hoje já tenho tudo em dia :P
    Ainda bem que o baby nasceu :D
    Próximo
    bjs

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